A Luta pelos Jardins, Mais Verdes e Mais Valorizados
Criada em 2007, a AME JARDINS tem como dever no seu estatuto a defesa e preservação do modelo arquitetônico e urbanístico dos Jardins, considerado um patrimônio histórico e cultural da Cidade de São Paulo.
Conversamos com o atual presidente, Fernando de Sampaio Barros, para saber sobre a nova resolução do Tombamento aprovada pelo Condephaat no final de 2024, suspensa atualmente por uma liminar na Justiça.
Fernando Sampaio de Barros – Presidente AME Jardins
Por que a nova resolução preocupa a maioria dos moradores dos Jardins América, Europa, Paulista e Paulistano?
Fernando Sampaio: Além de desfigurar o projeto urbanístico e arquitetônico dos Jardins, modelo que foi tombado pelo próprio Condephaat, a nova resolução coloca em risco uma das áreas verdes mais lindas da cidade, incentivando o aumento da impermeabilização, sobrecarregando as precárias redes de esgoto, galerias pluviais, redes de iluminação e o limitado traçado urbano.
Vocês procuraram conversar com o Condephaat?
Fernando Sampaio: Sim, a AME Jardins é uma associação democrática, aberta ao diálogo. Em maio de 2023, quando o Condephaat começou a elaborar a nova resolução, iniciamos uma série de reuniões com sua diretoria, promovemos eventos para ouvir propostas e ideias de moradores, arquitetos e urbanistas. Mas, a partir de junho de 2024, o órgão estadual fechou as portas para o diálogo, mudou o discurso e convocou uma votação às vésperas do Natal.
Qual foi a principal mudança no discurso?
Fernando Sampaio: A princípio, não entendíamos o motivo de uma nova resolução agora, já que a última havia sido aprovada em 2021. Em dois anos, nada havia mudado. Qual seria o motivo? O Condephaat alegou que não seria uma “nova resolução”, mas uma “compilação” das resoluções de 1986, 1988 e 2021. Acreditamos na boa-fé. No final, faltando uma semana para o Natal, apresentaram uma minuta com grandes mudanças estruturais, suprimiram vários artigos, levaram para votação algo que nem havia sido discutido com técnicos de órgãos importantes como o IAB, IPHAN e outros que participam da votação.
O processo foi uma grande decepção?
Fernando Sampaio: Com certeza, isso não é nada democrático. Trata-se de um jogo de cartas marcadas. Faltando uma semana para o Natal, minuta apresentada horas antes da votação, os técnicos já estavam inclusive em férias. No final, contaram 20 votos, mas só vimos 19 na sala. Disseram 13 x 07, exatamente os 2/3 necessários. Mas, sinceramente, só se alguém “votou no banheiro”.
A principal discussão é sobre condomínios residenciais?
Fernando Sampaio: Não, a principal questão é sobre condomínios empresariais e comerciais. Estão desviando o foco. Não é sobre unifamiliar x multifamiliar. Estes termos nem existem mais na nova resolução. Portanto, não há garantia que serão condomínios residenciais. Poucos perceberam isso. Estão abrindo a possibilidade de termos centenas de pessoas ocupando um lote onde hoje temos apenas uma família. O impacto ambiental será totalmente negativo.
Explique melhor o cenário dos condomínios comerciais.
Fernando Sampaio: Imagine um lote de 2 mil metros quadrados com 6 edificações térreas de 230 metros quadrados cada. Sejamos otimistas, vamos considerar edificações térreas. Com 25 funcionários em cada uma? Serão 150 funcionários, mais clientes e prestadores de serviços, ocupando um lote que hoje é ocupado por uma família. Se você pensar numa edificação de três andares, 10 metros é o limite possível. Com 50 funcionários, serão 300 funcionários num único lote. Quem mora no Jardins sabe que não temos infraestrutura, redes de esgoto, galerias pluviais, a rede elétrica é horrível, o traçado urbano é tombado, não podemos ter mais ruas. O cenário ficará caótico, lembrando que o uso comercial acarreta sempre mais impermeabilização.
O Condephaat alega que o comércio não traz impermeabilização.
Fernando Sampaio: Eles vivem no mundo da fantasia. Você acredita mesmo que os comércios deixam 30% de grama no lote? Plantam árvores que são exigidas pela lei? É mais fácil acreditar em Papai Noel. No papel, para aprovação, tudo é lindo. Na prática, a realidade é outra. São poucos os comércios que respeitam as regras do Tombamento. Faça uma imagem com drone na Avenida Europa e outra na Sampaio Vidal e veja quem tem mais árvores e áreas permeáveis. Quem vive no mundo real conhece a falta de capacidade da fiscalização. Os infratores serão beneficiados e o aumento da impermeabilização será uma realidade. O Condephaat sabe disso, a narrativa deles não se sustenta.
Qual o principal impacto com a impermeabilização?
Fernando Sampaio: Os Jardins sofrem com as enchentes. As águas das chuvas que caem nas avenidas Paulista, Dr. Arnaldo e Heitor Penteado descem para o Rio Pinheiros. Além de servirmos de pulmão e ar-condicionado para a região, somos também um bairro esponja. Nos últimos anos, com a verticalização de Pinheiros e Rebouças, as chuvas e enchentes no Jardim Paulistano estão mais fortes. Os alagamentos estão mais frequentes. Várias casas ficam alagadas, muitos moradores já perderam carros. O prejuízo é grande.
Se aumentarmos a impermeabilidade do solo, não serão só carros submersos, mas casas. Infelizmente, as enchentes no Brasil nos últimos anos não serviram de lição. Boa parte do mercado imobiliário vive ainda nos tempos do capitalismo selvagem. Para algumas construtoras, ESG são apenas três letras. A voracidade pelo lucro a qualquer custo é assustadora.
Alguns veículos de imprensa citaram “mansões vazias”, “herdeiros sem dinheiro” para sustentar suas casas. Qual o cenário atual dos Jardins?
Fernando Sampaio: Este cenário é falso, não se sustenta nos números. Quantas mansões vazias? Quantos herdeiros falidos? Existe 2% de casas e terrenos vazios, número absolutamente normal em qualquer cenário imobiliário. A maioria das casas e terrenos vazios está com problema na documentação, têm disputas judiciais ou precificação acima da realidade. Nos últimos anos, a média anual manteve-se acima de R$ 1,2 bilhões de negócios fechados. O cenário dos Jardins é de bairro valorizado, novas casas sendo construídas, mercado aquecido. Não podemos enfeiar quatro bairros maravilhosos porque meia dúzia de herdeiros está vivendo em casas milionárias, mas não conseguem pagar suas contas. Eles são egoístas, querem vender bem mais caro e sair fora do bairro. Para eles, tanto faz o bairro ficar horroroso.
Vocês chegaram a considerar projetos de condomínios?
Fernando Sampaio: Durante as reuniões e eventos que promovemos surgiram algumas ideias que poderiam ter avançado. Uma delas obrigava a manutenção da mesma área construída, simplesmente dividindo a edificação em várias famílias. Seria uma espécie de Townhouse. Outra permitia condomínios residenciais apenas nos atuais corredores comerciais e em lotes acima de 2 mil metros. Mas, isso tudo foi abandonado. Prevaleceu o lobby das construtoras interessadas no próprio bolso, empresas que não estão nem aí com o meio ambiente, não se importam com o legado negativo que deixarão na cidade.
Vocês acreditam que terão sucesso na Justiça?
Fernando Sampaio: Sim, entramos com recurso administrativo e, caso não tenhamos sucesso, entraremos nas vias judiciais. A previsão é de uma longa batalha. De um lado, os moradores lutando pela preservação dos Jardins, pela qualidade de vida na cidade. Do outro, as construtoras do mal e alguns proprietários que não estão nem aí com os vizinhos, buscando seu bilhete premiado. Espero que a Justiça fique ao lado da imensa maioria, dos moradores que têm direito à qualidade de vida e dos paulistanos que amam esta cidade.
Como vocês pretendem custear as ações na Justiça?
Fernando Sampaio: Associados, moradores e paulistanos que defendem uma cidade mais verde e sustentável estão doando para nossa vaquinha, o que demonstra espírito de coletividade em defesa de um bem comum. A maioria das pessoas tem doado R$ 1 mil reais, mas qualquer quantia é muito bem-vinda. Esses recursos já foram usados para custear o recurso administrativo que ingressamos perante a Secretaria de Cultura estadual e serão de grande importância para contratação de laudos técnicos de urbanistas que embasarão a Ação Civil Pública que deveremos propor para defesa do tombamento dos Jardins.
Entre em contato:
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